O ex director da organização de saúde da ONU Brock Adams alegadamente proferiu uma das frases mais emblemáticas dos nossos tempos:
“Para atingir o governo mundial, é necessário remover das mentes dos homens o seu individualismo, a lealdade à família, tradições, nacionalismo patriota e dogmas religiosos”.
À primeira vista parece uma frase carregada de radicalismo que não merece demasiada atenção, mas o facto é desde o fim da segunda guerra mundial que as elites do mundo ocidental estão empenhadas em promover o fim destes supostos “vícios” da mente popular. Não é preciso procurar muito para verificar que o discurso “educativo” governamental europeu equipara o tradicional amor pela nação a uma forma de xenofobia perigosa e equipara o apego às tradições locais a uma espécie de negação anacrónica (e até patológica) da modernidade globalizada.
No ocidente, desde o pós-guerra que as nações passaram a ser vistas como perigosas, como entidades nocivas ao ser humano e que como tal precisam de ser diluídas, contidas ou, preferencialmente, abolidas. Nasceu assim a ideologia anti-nação, tal como o amor das elites pelo supranacionalismo, onde se destaca, naturalmente, o nascimento do projecto da União Europeia.
Como resultado, para estas elites, avançar para um governo europeu de um momento para o outro seria impossível devido à existência destes “vícios da mente” que ditam inexoravelmente que as pessoas se preocupam mais com os que pertencem ao seu grupo (nação ou família) do que com os que não pertencem, e como tal prezam a sua independência. Perante este obstáculo, as elites europeias optaram por uma integração opaca e à revelia dos povos, baseando-se no excelso modelo económico do futuro (o euro, o mercado único, harmonização legal e fiscal, eurobonds, etc…). Porém, como todas em todas as centralizações de poder, a competição económica jurisdicional perde-se e o relativo declínio económico torna-se um destino fatal. Contudo, não serão os actuais problemas económicos que destruirão as nações; os ex-países da União Soviética também passaram pelo declínio material comunista e conseguiram refazer a sua vida aderindo à economia de mercado e mantendo intacto o seu espírito nacional.
Não, dificilmente será pela via económica que as nações serão abolidas; o segredo para tal está, obviamente, na política de imigração que o supranacionalismo impunha. Este baseia-se numa ideia simples amplamente documentada por historiadores: se os nativos deixarem de ser as únicas vozes dentro das nações, estas perderão a sua força como entidades políticas e sociais. Inicialmente, a abolição de fronteiras foi feita entre os países da União Europeia, mas rapidamente se constatou que a migração permanente entre países europeus foi quase insignificante (tirando os casos mais recentes de países como a Roménia). As diferenças económicas entre países europeus não eram tão grandes ao ponto de desafiar em massa o apego dos europeus a viver nas suas nações. Perante este “fracasso”, avançou-se paralelamente com o plano B, imigração não-europeia; e esta estratégia, devido às diferenças económicas entre a Europa e os países de origem dos imigrantes, foi extremamente bem sucedida (principalmente para partidos de esquerda, que assim ganharam eleitorado).
Programas de refugiados, justificações de que os países precisam de imigração em massa para ter crescimento económico, a defesa da sustentação da segurança social pública, alegações de dívidas morais para com outros povos … todas as justificações serviram o propósito. Como consequência, países como o Reino Unido, França, Alemanha, Itália, Suécia, estão agora todos com grupos de imigrantes com números elevados que em vários casos chegam a rondar os 20% da população.
Chegados a este ponto, torna-se relevante questionar o que são nações e se estas podem de facto ser abolidas.
Uma nação é tipicamente definida como um grupo territorialmente circunscrito cujos elementos estão ligados por tradições, genealogia, valores, cultura, língua, religião e normas sociais. Naturalmente, uma nação nem sempre corresponde a um Estado soberano e muitas vezes existe apesar dessa falta de independência, mas é lógico que quando sentem a sua identidade em causa essa necessidade torna-se premente (e.g. País Basco, Catalunha, Escócia). Outra noção mais alargada de nação não implica um território específico mas apenas uma ligação familiar/cultural dispersa geograficamente, tal como era o caso dos judeus antes da formação do Estado de Israel.
De uma perspectiva evolutiva, o espírito de nação pode ser explicado com a formulação canónica da “Inclusive fitness” do biólogo William Hamilton, que postula que os indivíduos estarão sempre mais dispostos a sacrificar-se por outros indivíduos que estejam genealogicamente próximos do que por indivíduos que estão distantes; algo óbvio em relação a familiares, mas igualmente relevante para o espírito de nação como família alargada, em que o altruísmo devotado ao “in-group” (nação) é totalmente diferente do que é devotado ao “out-group” (os outros).
De facto, ao olhar-se para as chinatowns espalhadas pelo mundo ou para outras comunidades, rapidamente percebemos que os indivíduos por norma trazem “a nação” com eles, especialmente quando há uma diferença acentuada entre a nação receptora e a nação “exportadora”.
Assim sendo, é possível abolir as nações?
É possível que se consiga abolir uma ou duas ou 10 nações em concreto, mas dificilmente será possível abolir o conceito de nação como entidade real e orgânica. Dadas as tendências comportamentais humanas, as tentativas actuais de criar o homem universal sob o mesmo Estado estão muito provavelmente condenadas ao fracasso e não vão fazer mais do que baralhar os mapas das nações, com prováveis conflitos territoriais pelo meio.
O prémio Nobel e economista Thomas Schelling demonstrou no seu modelo de segregação que basta que os indivíduos tenham uma leve preferência pelos “seus” para que o mapa se transforme por completo levando a uma completa segregação territorial. Isto não é surpresa para ninguém, mas as elites ocidentais, munidos dos seus pensadores racionalistas, declararam guerra à tradição, para que no fim de todas as crispações entre grupos se volte a uma situação de independência grupal. É por isto que o problema da União Europeia (e dos EUA) está muito para além do Euro e das questões económicas. É sim um problema de conceptualização utópica da essência humana e de ignorância propositada sobre a história dos grupos na natureza.
Sem surpresa, os países orientais como o Japão ou a China não aderiram a estas ideologias anti-tradição e anti-nação; tal irá fazer com que não só possam manter as suas identidades, mas também com que consigam evitar todos os problemas que a ruinosa tentativa de criar novas identidades por decreto irá trazer.
Por conseguinte, o actual racionalismo anti-nação é possivelmente o maior inimigo das liberdades que o mundo ocidental enfrenta, mas este enfrenta necessariamente um inimigo ainda maior: a nação.